quarta-feira, novembro 22, 2006

NOTA JUSTIFICATIVA ABRE LIVRO 'OLIVEIRA DO BAIRRO - EM BUSCA DA HISTÓRIA PERDIDA'


NOTA JUSTIFICATIVA [1]
A Câmara Municipal, ao patrocinar a publicação deste Livro "Oliveira do Bairro – Em Busca da História Perdida", fá-lo em honra de gerações de "Homens Bons" a quem estiveram confiados os destinos do nosso Concelho desde 1820 até aos nossos dias.
As diferentes épocas e diversas e polémicas circunstâncias em que o Concelho foi gerido, a partir de 1820, com mais ou menos autonomia, com mais ou menos capacidade financeira, correspondem às diferentes épocas político-administrativas por que passou Portugal a partir de 1820, às quais me permito, de uma maneira rápida, fazer uma curta incursão histórica, explicativa das razões que, ao longo dos tempos, levaram aos diferentes avanços e recuos do Municipalismo.
Assim, com as invasões francesas e a fuga de D. João VI para o Brasil, os Municípios foram despojados de alguns poderes e vergados à crise política e social que se abatera sobre Portugal.
Em consequência da referida crise, os Municípios Portugueses, nos primeiros anos do século XIX, mantiveram-se sem dar sinais de vida, agravando-se a letargia em que já se encontravam mergulhados desde os séculos XVII e XVIII.
A revolução liberal de 24 de Agosto de 1820, que marca o fim do período que é comum ser designado como "Antigo Regime", surgiu no quadro de quase vazio político-institucional, então existente em Portugal, em que, na sociedade portuguesa, fundamentalmente rural, tudo ficava longe de tudo e de todos, com os povos, os lugares, as vilas e as próprias cidades sem poderem comunicar entre si e num contexto da presença dominadora do poder britânico.
Os liberais, uma vez instalados no poder, iniciaram então uma vasta acção tendente a levantar o País do caos em que tinha caído, promulgando a Constituição de 1822 que consagrou a primeira reforma dos Municípios do século XIX.
Esta "Constituição" previa a existência de Câmaras, compostas por Vereadores em número a designar por lei, por um Procurador e um Escrivão, em todos os povos onde conviesse o "Bem Público".
A construção do "Estado Moderno", permitido pelo Regime Liberal, foi, contudo, um processo lento, num País que, durante as duas primeiras décadas de "Constitucionalismo Monárquico", sofreu graves crises financeiras, num período marcado por lutas contínuas e por vezes violentas, entre as variadas facções.
Entretanto, no período de 1828 a 1834, ocorreu a maior Reforma Administrativa Portuguesa de autoria de "Mouzinho da Silveira" que elaborou, pela primeira vez, um conjunto de diplomas definidores, de dois grandes princípios de "Administração Pública Portuguesa", a saber:
I ° Separação entre a Administração e a Justiça e correspondente separação entre os Orgãos Administrativos e os Tribunais.
2° Absentismo do Estado nas áreas económica, cultural e social, de acordo com as ideias do Liberalismo que se pretendia implantar no País
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A referida Reforma da Administração Local feita pelo Decreto n° 23 de 10 de Maio de 1832 tinha por base a organização Administrativa Napoleónica, estando por isso imbuída de princípios centralizadores, a ponto de reduzir as Câmaras Municipais a pouco mais que meros Orgãos Consultivos do Governo Central.
O Reino dividia-se em Províncias, Comarcas e Concelhos. As Províncias eram administradas por um Chefe com o nome de Prefeito, existindo um Sub-Prefeito na Comarca onde não existisse Prefeito e os Concelhos eram administrados por um Provedor, sendo todas estas Autoridades Administrativas nomeadas pelo Rei.
Não obstante os clamores e protestos vindos de todo o País, o regime, consagrado no Decreto de 1832, manteve-se em vigor até 31 de Dezembro de 1836, data em que foi aprovado o novo Código Administrativo que ficou conhecido por "Código de Passos Manuel" e que adoptou um Sistema Administrativo de pronunciada tendência descentralizadora, tendo assim sido reforçada a autonomia dos Municípios.
Decorridos sete anos, foi publicado um novo Código Administrativo (1842), de índole marcadamente centralizadora que registou uma nova fase da organização administrativa. O sentido centralizador deste Código de 1842, conhecido por "Código de Costa Cabral", encontra-se essencialmente, na figura do Administrador do Concelho que era um representante do Poder Central junto da Administração Local e na ampliação dos poderes de tutela do Poder Central sobre os Municípios.
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Este Código trouxe como novidade a criação do Conselho Municipal, constituído por contribuintes eleitores cujo voto favorável devia concorrer com o da Câmara nas deliberações que assumissem maior relevância para as funções dos Municípios.
Entre 1854 e 1870, foram ensaiadas várias Reformas Administrativas, todas fracassadas, não pelo seu desmérito, mas pela instabilidade político-social existente, verificando-se então a supressão de grande número de Municípios.
Com a publicação do Código Administrativo de 1878, consagra-se, mediante um apreciável esforço de clareza e simplificação, o respeito pelas tradições históricas e seculares de Portugal, na manutenção de autonomia e foros Municipais.
Todavia, a acesa disputa a que se assistiu entre os dois Partidos que alternavam no poder "(Partido Regenerador e Partido Progressista)", levou a que a Autonomia dos Municípios tivesse sofrido sucessivos avanços e recuos até ao fim da Monarquia.
Se, no período da República, a Administração Pública Portuguesa passou a ser enformada por princípios descentralizadores e de Autonomia, merecendo especial referência as eleições dos órgãos locais, durante o regime político que ditou os destinos dos Portugueses, no período de 28 de Maio de 1926 a 24 de Abril de 1974, os Municípios foram asfixiados política, administrativa e financeiramente, pelo Governo.
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Apesar das vicissitudes porque os Municípios passaram, Teixeira de Pascoaes, no seu Livro "A Arte de Ser Português" afirma: "Foi por intermédio da vida Municipal que, entre nós, a família começou a existir politicamente", acrescentando que "Os Municípios devem ser o ponto de contacto entre a família e a pátria, dimanando o Estado directamente daqueles", para concluir que "o Estado derivaria da própria organização Municipalista".
Só com a mudança do Regime Político, verificada em 25 de Abril de 1974, que restituiu a Liberdade Política aos Portugueses e fez a rotura completa, política e administrativamente, foram restaurados os princípios da Autonomia das Autarquias Locais e da descentralização democrática da Administração Pública, conquistando aquelas também novas atribuições e competências próprias e exclusivas e assumindo ainda, por essa via, novas responsabilidades.
A Autonomia do Poder Local foi concerteza uma das maiores conquistas que as populações viram consagradas na Constituição da República Portuguesa de 1976, sendo os anos de 1976 e 1977 determinantes para a fixação do actual regime de organização e funcionamento do Poder Local.
Foi, pois, no contexto político-administrativo, de 1820 até aos nossos dias, que "Homens Bons" geriram os destinos do nosso Concelho e do País, conforme o autor deste livro tão bem relata e descreve.
O caminho percorrido pela Administração Local, nestes anos de democracia, é garantia de que o Poder Local Democrático tem virtualidades para assumir o futuro do País, bastando para tal que as mesmas sejam aprofundadas.
A publicação deste livro é mais um trabalho de investigação cuidada que fica a dever-se ao Escritor Armor Pires Mota.
Foi com particular satisfação que vi ser aceite pelo autor o desafio que lhe fiz de acrescentar ao trabalho que ele já tinha em mente a identificação dos nomes de todos os "Homens Bons" que geriram os destinos do nosso Concelho, no período em análise.
Visando prestar-lhes merecida e perene homenagem, as fotografias cuja a recuperação foi possível fazer de alguns desses "Homens Bons" e lápides evocativas dos restante, serão descerradas no salão de Reuniões da Câmara, em sessão solene, no dia da apresentação pública deste livro.
A Câmara, ao relembrar a memória dos "Homens Bons” que serviram o Concelho, muitas vezes sem nada ganharem ou mesmo sofrendo com o arremesso das pedras da incompreensão, pretende, como afirma o autor do livro, trazê-Ios de volta ao seu povo e terra.
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A Câmara Municipal e o seu Presidente em particular, ficam a dever ao Escritor Armor Pires Mota esta valiosa obra, cuja leitura atenta permitirá reavivar alguns valores da nossa "memória colectiva", contribuindo assim para um melhor conhecimento histórico da realidade contemporânea das nossas raízes.
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Paços do Concelho de Oliveira do Bairro, Setembro de 1997
O Presidente da Câmara,
Acílio Domingues Gala
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[1] Nota Justificativa abre o livro de Armor Pires Mota, Oliveira do Bairro – Em Busca da História Perdida, edição da Câmara Municipal de Oliveira do Bairro, tiragem 1000 exemplares, Setembro de 1997.